Valvular Heart Disease Associated With Ergotamine | Revista Española de Cardiología

INTRODUÇÃO

Ergotamine é um alcalóide ergot usado para prevenir dores de cabeça vasculares como enxaqueca ou cefaléia em cluster. Seu uso prolongado ou excessivo deve ser evitado devido ao risco de ergotismo, gangrena ou tornar-se dependente da droga.

Devido ao seu efeito vasoconstritor pode reduzir o fluxo cerebral, precipitar angina, produzir enfarte do miocárdio ou agravar uma claudicação intermitente. Contudo, o seu efeito nas válvulas cardíacas é menos conhecido. Descrevemos agora 2 casos de cardiopatia valvular.

Caso 1

Uma pessoa de 30 anos de idade, do sexo masculino, foi enviada da unidade gastrointestinal, onde estava em estudo devido a uma hepatomegalia dolorosa, pois a radiografia de tórax revelou cardiomegalia. Ele não tinha histórico de doença cardíaca ou febre reumática. Nos últimos 10 anos ele vinha usando supositórios de 2-mg de ergotamina profilaticamente duas vezes ao dia (Hemicraneal®) para suas dores de cabeça. Durante a exploração física, a ausculta revelou um sopro pansistólico na região mitral, sendo encontrada uma hepatomegalia dolorosa que se resolveu ao iniciar o tratamento diurético.

O eletrocardiograma mostrou mitral P, e o ecocardiograma demonstrou aumento valvar e subvalvar da valva mitral com insuficiência grave e insuficiência moderada da valva tricúspide. A função ventricular esquerda estava preservada e os diâmetros estavam dentro do limite superior de normalidade (fração de ejeção, 58%; diâmetro do ventrículo esquerdo, 57 mm).

Dada a idade do paciente, tentamos salvar as valvas e realizamos uma anuloplastia comissurotomia e anel Cosgrove na posição mitral e bicúspide. O exame macroscópico revelou um inchaço branco, opaco e induzido na válvula e no átrio (Figura 1); o exame microscópico revelou um inchaço subendotelial miofibroblástico (Figura 2). Apesar de apresentar falha mínima, o paciente retornou alguns meses depois com insuficiência mitral grave, necessitando do implante de uma prótese mecânica (Carbomedics). Após 2 anos de seguimento, o paciente permanece assintomático e abandonou o uso de ergotaminas.

Figura 1. Imagem intra-operatória da válvula mitral.

Figure 2. Sob a superfície endocárdica (à esquerda da fotografia) existe uma camada de miofibroblastos dispostos em paralelo sobre uma matriz de mucopolissacarídeos com algumas fibras elásticas e colágenas que não destruíram a arquitetura tecidual nem apresentaram sinais associados de inflamação. À esquerda da fotografia pode ser vista uma coluna de miócitos a partir do miocárdio subjacente. Actina específica do músculo, Dako R, 1:5.

Case 2

Envolve uma mulher de 49 anos com uma história pessoal de doença psiquiátrica e uso crônico de 2-4 mg de ergotamina por dia durante os últimos 15 anos para controlar suas dores de cabeça. Ela foi internada no hospital 10 anos antes por vasculopatia induzida pela ergotamina que começou com isquemia subaguda nas pernas e estenose arteriográfica de ambas as cavidades poplíteas. Foi encontrada uma lesão mitral dupla moderada sob acompanhamento ecocardiográfico. Apesar disso, a paciente continuou a tomar ergotamina e não compareceu ao acompanhamento cardiográfico.

A paciente está atualmente sob os cuidados do serviço psiquiátrico que solicitou uma avaliação, uma vez que a paciente apresentou dispnéia aos médios esforços. O exame ecocardiográfico revelou doença valvar múltipla (Figura 3) com estenose mitral grave, insuficiência mitral moderada e insuficiência valvar aórtica, tricúspide e pulmonar moderadamente severa, com função ventricular esquerda preservada (fração de ejeção 60%, diâmetro do ventrículo esquerdo 55 mm) e ritmo sinusal persistente.

Figura 3. Ecocardiografia ao longo do eixo apical, onde o inchaço das valvas mitral e tricúspide é evidente.

Devido aos achados e ao grau funcional da paciente, foi proposta cirurgia que ela rejeitou. Foi enfatizada a necessidade de abandonar completamente o uso de ergotaminas.

DISCUSSÃO

A doença valvar induzida por ergotamina é um distúrbio pouco conhecido devido ao uso cada vez menor destas drogas para controlar a enxaqueca, tendendo a aparecer apenas com uso crônico e excessivo, sendo uma complicação pouco freqüente.

Os 2 casos apresentados referem-se a pacientes com cardiopatia valvular devido ao uso crônico de ergotamina, tendo sido demonstrado histologicamente que é o agente causador no primeiro caso. No segundo caso, a ausência de antecedentes de febre reumática, o uso crônico e excessivo de drogas ergóticas e doença valvar múltipla nos levou a essa possibilidade diagnóstica, embora o diagnóstico final e definitivo seja anatomicopatológico1-3; sempre que possível o tratamento de escolha é a cirurgia para preservação das valvas.4,5

Assim, é importante auscultar pacientes que fazem uso crônico de ergotamina6 e, se houver sopro, o tratamento deve ser interrompido e o controle ecocardiográfico implementado.

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